Por Dimas Roque
Só no Brasil é que a palavra “evoluir” pode significar algo pior, medíocre, algo que perde a qualidade existente. E é exatamente isso que está acontecendo com as festividades de São João no Nordeste do Brasil, com a invasão de ritmos musicais e a transformação das quadrilhas juninas em espetáculos de escolas de samba.
Eu acredito que tudo pode mudar, mas para melhor, nunca para transformar o que é bom em algo que não representa mais o que costumava ser.
Vamos pegar como exemplo as novelas na televisão brasileira. Podemos lembrar de algumas do passado e de outras dos últimos dez anos. “Os Inocentes”, “O Grito”, “Mulheres de Areia”, “Pantanal”, “Pecado Capital”, “Roque Santeiro”. Elas possuíam textos primorosos, escritas por autores que vivenciavam a arte da criação com histórias populares que despertavam o interesse dos telespectadores. Diferentemente de hoje, em que autores e diretores escrevem sobre suas frustrações pessoais e impõem personagens e narrativas com as quais a maioria do público discorda. O resultado disso é a queda da audiência para níveis nunca antes imaginados.
As quadrilhas juninas estão se transformando em escolas de samba, o que representa uma modernização que descaracteriza sua essência cultural. As tradicionais roupas de matuto foram substituídas por vestimentas que lembram mais as escolas de samba desfilando na Sapucaí, no Rio de Janeiro. Além disso, músicas eletrônicas com batidas mais adequadas para festivais de Raves estão sendo incorporadas, o que certamente faria muito sucesso nesses eventos. No entanto, será que essa abordagem é apropriada para as festas de São João?
É importante preservar as tradições culturais para que as novas gerações possam compreender e conhecer um pouco da história de seus antepassados. As novas manifestações culturais podem conquistar seu espaço sem necessariamente destruir o que foi construído pelo povo local. Há espaço para que todos possam se expressar por meio de suas apresentações e receber seus cachês, mas cada um deve respeitar sua tradição específica.
O mesmo podemos perceber na música, nas quadrilhas juninas, nas comidas e nas bebidas típicas da região, que estão sendo substituídas por sabores que não representam a tradição das localidades. Como disse um dos leitores do artigo “Estão acabando com o São João do Nordeste”: “É com o coração apertado que assisto a esse processo de descaracterização das festas juninas nordestinas, capitaneado por pessoas cuja fome de dinheiro é insaciável. Escrúpulos e respeito às tradições da região são irrelevantes”, escreveu Eduardo Goulart.
Aproveito o momento para compartilhar também as opiniões de outros leitores, até mesmo daqueles com maior vivência em suas localidades na região. Eles falaram sobre o assunto em debate:
“Concordo plenamente! Um povo que não preserva e valoriza sua cultura se torna escravo e financiador da cultura alheia!”, Eduardo Goulart.
“Um povo que não preserva sua cultura é um povo sem memória!”, AMN.
“Eu nasci no Rio de Janeiro e há algum tempo mudei para Sergipe. A época que mais gostava, depois do Carnaval, era a das festas juninas. No Rio, os festejos juninos ainda são mantidos como antigamente. Sempre adorei as comidas, as roupas (caipiras de chita bem colorida, laços e rendas) e principalmente as músicas. No Rio, uma festa junina sem músicas de Luiz Gonzaga, Dominguinhos e outros do gênero não é festa junina.
Quando estava me mudando para o Nordeste, comentei sobre como seria bom morar lá, onde deveria ser o berço do forró e de tantas músicas e ritmos que fazem sucesso nessa época. Qual não foi minha surpresa ao participar da primeira festa na região, onde as músicas que principalmente os mais jovens querem são os ritmos sertanejos e eles não sabem nem se interessam pelas nossas músicas juninas de origem. Fiquei decepcionada ao conhecer o ‘maior São João do mundo’ (como dizem), na Paraíba.
Lá, a decepção foi ainda maior, a apresentação da quadrilha mais parecia um desfile de escola de samba, as caipiras eram de tecidos brilhantes, paetês e lantejoulas, cada grupo tinha até um tema, carro para abrir o desfile e fazer apresentação, algo horrível e absurdo.
As músicas, obviamente, eram de todo tipo, exceto as nossas músicas juninas de origem. Tradição é algo que não importa para eles. Eles não sabem que cresceremos quando preservamos nossas tradições, nosso folclore e tudo o que faz parte da história de um país”, Carmen Menezes.
Esse é um assunto que não acaba aqui, e não pretendo que meu pensamento seja absoluto sobre o tema. Mas uma coisa é certa: as manifestações culturais não podem ser apropriadas por empresários e prefeitos, nem pelos artistas, com o único propósito de ganhar dinheiro em abundância. Precisamos continuar o debate para que amanhã não tenhamos que presenciar uma quadrilha acompanhada por uma escola de samba e achar que isso será lindo.
Respeitem a cultura e as manifestações artísticas do meu Nordeste!
Um escritor pode trocar sua máquina de escrever por um computador, mas seus textos continuarão sendo escritos com sua personalidade.