Armações políticas têm limite na Justiça

Câmara aprofunda seu desgaste público ao se aliar aos advogados na inútil manobra da renúncia

*Por Dora Kramer/Folha de S.Paulo

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Foto: Reprodução

A renúncia de Carla Zambelli ao mandato já cassado pela Justiça resultou de uma manobra entre a presidência da Câmara e a defesa da condenada. A ideia era amenizar os danos para ambas as partes: deputados não aprofundariam o desgaste pelo descumprimento de ordem judicial e os advogados tentariam preservar os direitos políticos da cliente.

Não deu certo, como de resto acontece com gambiarras mal ajambradas. O malfeito ficou registrado nos anais do Legislativo e Zambelli, presa na Itália, continuará fora do jogo enquanto durar o cumprimento das penas por duas condenações criminais.

Guardadas as circunstâncias e proporções, o caso remete aos impeachments de dois presidentes que tiveram tratamentos distintos.

Fernando Collor tentou preservar os direitos ao renunciar na última hora, mas não conseguiu porque o processo já estava em andamento no Senado. Dilma Rousseff nem precisou recorrer ao estratagema: a Casa atropelou a Constituição para mantê-la em condições de disputar a eleição seguinte, na qual as urnas de Minas Gerais negaram-lhe o mandato de senadora.

A conclusão é que os atalhos do compadrio político, mais cedo ou mais tarde, por um motivo ou outro, esbarram nos limites da lei ou na vontade do eleitorado.

Alexandre Ramagem, condenado e fugitivo, iria pelo caminho da colega: absolvição na Câmara que aplicaria a ele peso e medida iguais. Diante do alto lá do Supremo, lhe restaria a renúncia. Duplamente inútil, pela inelegibilidade automática decorrente da condenação e permanência no exterior.

Zambelli e Ramagem estão sob o risco de extradição. Surgem teses segundo as quais os governos da Itália e dos Estados Unidos levariam em conta a complacência da Câmara para negar os pedidos do Brasil.

Ocorre que não há correspondência entre as posições do Legislativo brasileiro e as decisões dos Executivos estrangeiros. Ainda que não sejam mandados de volta, ficarão fora da política brasileira, no que terá sido cumprido o objetivo da lei.

**Dora Kramer
Jornalista e comentarista de política

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