A Santa Ceia do Cangaço

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Do fato, a foto a montagem tem de fato poder.

Por Darlan Valverde

Fotomontagem: Luci Guimarães

Uma composição muito bem distribuída, talvez o retrato que Benjamim tenha guardado em seus sonhos e nunca tenha tido a oportunidade de corporificá-lo.

Essa atmosfera em variada paleta de tons sépia ilustra com certa poesia a história e o desfecho de cada mulher estampada hoje em pixel. É o novo refazendo o velho. Se o objetivo era reconstruir uma concepção poderosa da imagem, aqui está ela.

Como a textura de uma efígie, as Marias que observo agrupadas nesse quadro, bem como as outras além delas, hoje meros espectros impressos em páginas de livros e softwares. Claramente inflamamadas por um novo reposicionamento vultoso, essas figuras despertam em mim profunda e desconcertante reflexão.

Vamos começar com Sérgia Ribeiro que, em pública declaração ao ser entrevistada, dizia alertar outras mulheres (meninas) sobre os perigos e mazelas de emergirem naquela vida desolada do cangaço. Lá está ela, a primeira cangaceira fixada da esquerda para a direita, ao lado da que, certamente, tenha sido a última depoente do nosso nordewestern. Ah, doce Dulce, última remanescente do bando, parece estar sendo abraçada por Dadá, logo ela que, ironicamente, nunca quis aquela vida e foi levada contra vontade ainda moçoila.

Então vejo Maria Jovina estrategicamente posta no fundo e ao centro entre Moça e Cristina, que portam notória similaridade com suas chapeletas sobre as cabeças. Porém, não iriam compartilhar do mesmo destino. Coincidentemente, as duas foram obrigadas a sair da horda nômade de salteadores. Uma, apesar de presa e viúva por duas vezes, pode ter sua vida continuada, enquanto a outra encontrou trágico fim sendo covardemente assassinada.

Na mesma sequência, ainda em segundo plano e em pé, percebe-se interessante detalhe: as compatriotas Adília e Sila, além de uma terceira que me parece ser Durvinha. Por favor, alguém me corrija se eu estiver equivocado. Distingue-se por esboçarem algo em comum. Incrustadas nessa paisagem vividamente destacam-se por serem as únicas a estarem sorrindo.

O cangaço e suas mulheres remotando fotos de fatos. A mística cena tem cheiro, tem cor, tem barulho. Ela nos entrega onze mulheres sustentadas nessa intrigante e epifânica imagem, revelando, portanto o número exato que corresponde aos cangaceiros mortos na Grota do Angico.

E por fim, temos o primeiro plano provocando-nos para o deleite de uma perfeita concepção estética: a pequena pankararé Inacinha, estadeando ao lado da figura central, Maria Gomes de Oliveira, a Maria de Déa, a Maria do Capitão transmutada para a posteridade como Maria Bonita, empalada na soberania, sentindo por hora ocupar-se do trono de Deus.

Responsável pela virada de chave que permitiu a entrada das mulheres na cabruêragem. Mima-se despreocupada, rutila-se e ostenta em seu lado direito Nenê do Ouro. Ouro motivo qual tanto se matou e morreu. Ouro que tanto cintilava de forma ardente nos corpos que o carregavam. Trajes adornados, aformoseados, polido como espelho que refletia aventura, violência, dor e morte.

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