Por João Badari*
No último dia 28 de setembro, recebi a triste notícia de um amigo com problemas cardíacos, que foi internado na UTI e irá passar por uma cirurgia de risco. A filha enviou um atestado médico para que eu realizasse o pedido de urgência em seu processo de Revisão da Vida Toda, pois assim poderiam obter o justo benefício do pai e comprar a medicação necessária.
Este é um, de milhares de casos, que cotidianamente chegam ao meu conhecimento. No decorrer de 15 anos atuando no direito previdenciário, 10 anos nesta específica revisão, e mais de 3 anos como Amigo da Corte no processo que tramita no Supremo Tribunal Federal, resolvi escrever um texto menos técnico, sem juridiquês e seus argumentos processuais, para uma reflexão como cidadão. Deixei o CNPJ de lado para escrever com meu CPF.
É impossível não se envolver emocionalmente com a ação, pois convivo/atendo diariamente cidadãos idosos, em sua maioria que estão doentes, e não raramente recebo a ligação da companheira ou outro familiar, que ele faleceu enquanto aguardava o seu direito. E também vejo pessoas que conseguiram vencer a ação e estão hoje vivendo com uma aposentadoria mais digna, percebendo o impacto social que a melhora traz em suas vidas.
Este direito busca trazer sacolas de mercado um pouco mais pesadas, a possibilidade da compra de medicamentos, o pagamento de contas de água e luz, e em um caso específico: a compra de um andador para o neto, conforme uma senhora me escreveu quando saiu a sua tutela de evidência, possibilitando o imediato aumento de seu benefício previdenciário.
Tenho dois casos que me marcaram nestes últimos dias: a senhora Márcia, que era nossa cliente, veio a falecer. Ela tinha câncer, e seu único pedido para mim foi: “quero deixar uma pensão por morte um pouco maior, para meu filho conseguir terminar o colegial”. Seu esposo me chamou no WhatsApp informando o falecimento, e eu ainda não consegui o aumento do benefício. Isso é angustiante, me faz pensar no célebre Raul Seixas em sua obra “Ouro de Tolo”:
“E você ainda acredita
Que é um doutor
Padre ou policial
Que está contribuindo
Com sua parte
Para o nosso belo
Quadro social”
Não pude contribuir com a obtenção de justiça para a Dona Márcia, mas espero que brevemente consiga para seu filho. E tenho a senhora Luz, que era casada com um cliente, o senhor Gedei, e antes dele falecer disse a ela “procure o meu advogado, pois ele vai conseguir melhorar a minha aposentadoria, com isso você irá sobreviver”. Ela me mandou no WhatsApp o papel que ele tinha com meu número.
Não existe uma maneira de se manter frio e impessoal com a Revisão da Vida Toda. São vidas que precisam deste valor para minimamente viverem com dignidade. E pagaram por isso.
A Revisão da Vida Toda já tramita há mais de uma década, e o STF corrigiu em seus dois plenários uma ilegalidade cometida pelo INSS há duas décadas. Desde o ano de 1999 aposentados são lesados em seus benefícios com um cálculo que não refletia a vontade da legislação, e isso foi assegurado pelas duas mais altas Cortes do país.
O Supremo Tribunal Federal protegeu brilhantemente o direito social e a intenção legislativa no Tema 1102, porém, o INSS utilizando a infindável possibilidade de recursos, embargou a irretocável decisão, trazendo com isso prejuízo aos aposentados que estão aguardando pela justiça.
Torço para que brevemente isso se resolva, pois tal estratégia só traz como ganhador o INSS, que mesmo perdendo a ação, tem diariamente economia em seus cofres, em razão do elevado número de idosos que estão falecendo e outros milhares que estão sendo impossibilitados de exercerem sues diretos pela decadência.
*João Badari é advogado especialista em Direito Previdenciário