Parecer afirma que filho de Bolsonaro sequer comunicou ausência do país à Câmara
Por Mônica Bergamo/Folha de S.Paulo

O presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), barrou a indicação feita pelo PL para que Eduardo Bolsonaro (PL-SP) fosse o líder da minoria na Casa.
Com isso, o filho do ex-presidente Jair Bolsonaro seguirá tendo faltas computadas e deve perder o mandato. O PL tinha feito a indicação pois, no cargo, Eduardo não teria obrigação de comparecer à Câmara para as sessões.
Um parlamentar não pode ter mais do que 1/3 de ausências não justificadas em sessões deliberativas. Eduardo acumulava no começo do mês mais da metade: 18 faltas em 32 sessões.
O plano dele de sair candidato a presidente da República também fica comprometido. Além da possível perda de mandato, Eduardo foi denunciado na segunda (22) pela PGR (Procuradoria-Geral da República) por tentativa de coação ao STF.
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Motta se baseou em um parecer que aponta diversas irregularidades na pretensão do PL.
Ele afirma que, entre as obrigações de um parlamentar está a de frequentar presencialmente o Congresso. O registro remoto, embora possível, é exceção permitida apenas a deputados que estão em missão autorizada para representar a Casa.
Não é o caso do auto-exílio declarado por Eduardo Bolsonaro, que sequer comunicou à Casa que se ausentaria do país e das sessões deliberativas.
“A ausência de comunicação prévia sobre o afastamento do território nacional, como ocorre no caso em análise, constitui, por si só, uma violação ao dever funcional do parlamentar”, diz o texto.
“Mais do que isso”, segue o parecer. “Essa omissão impede que a ausência à Casa seja enquadrada em qualquer hipótese de excepcionalidade que autorize o registro de presença à distância. Um afastamento não comunicado à Presidência da Câmara não pode, sob nenhuma ótica, ser considerado uma missão autorizada, pois lhe faltam os elementos essenciais de autorização, formalidade e ciência oficial.”
A decisão foi tomada no momento em que as tensões com o Supremo Tribunal Federal (STF) em torno de um acordo para reduzir penas de Jair Bolsonaro aumentaram. E está sendo vista por parlamentares que já tomaram conhecimento dela como uma resposta à militância de Eduardo por retaliações ao Brasil junto ao governo dos EUA.
Na segunda (22), o governo do norte-americano Donald Trump estendeu sanções econômicas já aplicadas ao ministro Alexandre de Moraes à mulher dele, Viviane. Ela e a empresa familiar do casal foram enquadrados na Lei Magnitsky, que visa sufocar a vida financeira dos atingidos.
A medida travou o diálogo entre a Câmara e o STF para que a anistia ampla, geral e irrestrita a Bolsonaro fosse trocada por uma redução de penas e o benefício que permitiria que ele fosse colocado em prisão domiciliar.
O parecer no qual Hugo Motta se baseou afirma que o regimento interno da Câmara dos Deputados e outras normas estabelecem os deveres dos parlamentares, determinando que “o comparecimento efetivo do Deputado deve ser registrado em postos eletrônicos instalados nas dependências da Casa”.
“A evolução tecnológica e as circunstâncias excepcionais, como a pandemia, levaram à criação de mecanismos alternativos, como o registro de presença por meio do aplicativo Infoleg durante as sessões semipresenciais”, afirma ainda o texto.
“Contudo, essa faculdade não é irrestrita e não exime o parlamentar do cumprimento de seus demais deveres regimentais”, segue.
O registro remoto, segundo ainda o documento, só pode ser feito por “parlamentar que esteja no desempenho de missão autorizada pela Câmara dos Deputados”.
Segue o texto: “O conceito de missão autorizada é estritamente definido pelo RICD [regimento interno] como uma representação oficial da Câmara, para cumprir missão temporária, devidamente autorizada e comunicada”.
“Trata-se, portanto, de uma exceção que se aplica a uma atividade parlamentar específica, formal e de conhecimento da Casa”, diz ainda o parecer publicado por Motta.
Um outro artigo “impõe um dever claro e inafastável a todos os membros da Casa: ‘Para afastar-se do território nacional, o Deputado deverá dar prévia ciência à Câmara, por intermédio da Presidência, indicando a natureza do afastamento e sua duração estimada’.””
A informação prévia seria um requisito “mandatório para qualquer ausência do país, independentemente de sua natureza, seja ela particular ou em missão oficial”.
Eduardo Bolsonaro não comunicou previamente à Câmara que sairia do país, mas apenas quando já estava nos EUA, pelas redes sociais, num declarado auto-exílio.
Além disso, diz o parecer, “não obstante ser o exercício do mandato inerentemente presencial, a função de Líder o é com ainda maior intensidade. A ausência física do parlamentar do país o impede de exercer prerrogativas e deveres essenciais à Liderança, tornando seu exercício meramente simbólico e em desacordo com as normas regimentais”.